Quem cuida?

Especialistas no assunto ‘Guarda Compartilhada’ debatem sobre novas aplicações da lei durante entrevista à FIVE

Compartilhe:

Compartilhar no whatsapp
Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no pinterest
Compartilhar no linkedin

Conforme a antiga Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, do Código Civil, a guarda compartilhada era um instrumento legal de opção do casal. Com a aprovação da nova legislação, entre 2008 e 2014, que acrescentou novos aspectos e determinações, o que era uma possibilidade, agora virou regra, que só pode ser alterada em casos muito especiais.

Em 22 de dezembro de 2014, a Lei 13.058 estabeleceu o significado da expressão “guarda compartilhada” e tratou sobre sua aplicação, modificando assim os artigos 1.583, 1.584, 1.585 e 1.634 da Lei 10.406/2002. Outro assunto importante, que será abordado nesta matéria, é a “Síndrome da Alienação Parental”, retratada na Lei 12.318/2010.

● Paulo Cezar Dias é coordenador da Vara da Família e Sucessões de Assis e instrutor da Oficina de Parentalidade, Divórcio, Pais e Filhos pelo CNJ

Para entender melhor o tema, o advogado, mestre e doutorando Paulo Cezar Dias, que é ainda coordenador da Vara da Família e Sucessões de Assis, professor de processo civil e filosofia e instrutor da Oficina de Parentalidade, Divórcio, Pais e Filhos pelo CNJ (Conselho Nacional da Justiça), foi convidado pela FIVE para uma entrevista.

De acordo com Dias, o tema é de extrema e atual relevância porque retrata a questão atual das famílias. No ponto de vista dele, dentro do cenário histórico, a mulher ganhou mais protagonismo na sociedade e, assim, passou a ter condições de cuidar de um filho em caso de separação do marido. “Aquela imagem deixada pelo passado de que a mãe sempre deve ter a guarda da criança porque tem mais tempo livre dentro de casa acabou com as transformações da família de hoje. A mulher passou a ser arrimo de família e exerce a função de cuidar dos filhos. A sociedade se transformou ao longo do tempo e as pessoas obtiveram mais independência, seja marido, mulher, companheira e companheiro, considerando casais homoafetivos também, pois todos têm direito em formar uma família. Em consequência disto, passamos a ter a ruptura dos relacionamentos, o que provoca uma discussão no campo jurídico para que a separação de pais não deixe traumas, em especial, nas crianças, nos filhos”, complementa.

No dia a dia, faltam profissionais especializados e capacitados para realizar audiências de mediação e conciliação

No momento de uma separação, os pais seguem seus caminhos, mas a criança fica e sofre com a ruptura. “Foi por isso que surgiu o tema guarda compartilhada, que assegura que todos os direitos relativos à criança e ao adolescente sejam decididos em conjunto pelo pai, mãe ou companheiros responsáveis. Não é mais uma guarda unilateral. A criança não vai residir de forma compartilhada com seus genitores, mas, dentro do dever da lei, os legisladores, magistrados, MP (Ministério Público) e a Defensoria acabam solicitando estudos psicossociais com a finalidade de descobrir o melhor local para a criança ficar residindo. Porém, as decisões são compartilhadas”, detalha Paulo Cezar.

Sobre a alienação parental, Dias esclarece que existe uma síndrome comum em casos de separação. “Alienação é quando os genitores falam mal um do outro para a criança, fazendo com que gere uma confusão na cabeça do filho, deixando-o perdido, alienado e em dúvida com quem vai residir. O filho, às vezes, acaba levando informação negativa da mãe para o pai e vice-versa”, comenta.

A SAP (Síndrome de Alienação Parental), também conhecida pela sigla em inglês PAS, é o termo proposto por Richard Gardner em 1985 para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a treina para romper os laços afetivos com o outro genitor, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação ao outro genitor. Os casos mais frequentes da síndrome estão associados a situações onde a ruptura da vida conjugal gera, em um dos genitores, uma tendência vingativa grande. Neste processo vingativo, o filho é utilizado como instrumento da agressividade direcionada ao parceiro.

● Melrian Simões é conselheira pela OAB/31ª Subseção do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Marília

Segundo a especialista em direito civil e mestre em teoria do direito e do Estado, Melrian Simões, que é conselheira pela OAB/31ª Subseção do Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Marília, em casos de separação, o filho pode ter apoio psicológico.

“Durante o processo de separação, havendo dúvidas, o MP e o magistrado podem requerer o estudo psicossocial para reforçar uma tese de que a guarda compartilhada é o melhor caminho ou para apontar a impossibilidade desta afixação. Caso pai e mãe entenderem por bem a decisão compartilhada, o estudo nem é feito. Porém, sempre penso que o magistrado deve ter contato com os filhos para exatamente solicitar o estudo e serviços de apoio psicológico. A criança sofre com a separação e este fato não pode ser ignorado. O direito não abarca a psicanálise”, destaca.

Melrian explica ainda que o juiz averiguando riscos comprovados, no que diz respeito à integridade física e moral da criança, o divórcio pode ser decretado, mas a guarda do filho deve ser transferida para outras pessoas aptas aos devidos cuidados. “Neste caso, os avós podem assumir a guarda da criança. Geralmente, após a afixação da guarda, é quando começam as denúncias entre os pais, tudo para tumultuar ainda mais a vida da criança. Pode ocorrer também negligência e abandono”, reforça.

● Bruno Baldinoti, advogado em direito empresarial, professor universitário e mestrando em teoria do direito e do Estado.

Bruno Baldinoti, também debateu o assunto com a FIVE e argumentou que, com as novas aplicações da lei da guarda compartilhada para a resolução dos conflitos de uma separação e análise das consequências junto aos filhos,

é necessário um acompanhamento de profissional especialista. Para ele, o consenso da separação acaba se esbarrando na barreira psicológica, quando a criança absorve aspectos negativos e ofensas entre seus pais.
“Percebo que no dia a dia, faltam profissionais especializados e capacitados para realizar audiências de mediação e conciliação. Por conta das exigências do CNJ, os mediadores acabam encerrando o processo para apontar números de casos resolvidos na estatística geral. Casos encerrados são vistos como resultados positivos. Infelizmente, o Judiciário vê quantidade e não qualidade na forma como os processos são concluídos. Os mediadores precisam resolver o problema e não meramente concluir o processo no campo jurídico”, argumenta

Na guarda compartilhada, as decisões sobre o filho são tomadas em conjunto

Uma hipótese para se aprimorar a solução dos conflitos de separação e guarda dos filhos, conforme argumenta Baldinoti, é o investimento na capacitação dos mediadores. “Assim, logo no início do processo de divórcio, o mediador pode enxergar o problema para amenizar a barreira psicológica da família e apontar soluções. Mesmo no século 21, ainda temos aquela visão patriarcal, onde o homem é a liderança maior, provocando agressões à mulher, o que complica o processo de separação. São contextos que o mediador e conciliador devem observar, sem deixar o filho de lado. Também acho que trabalhos governamentais de políticas públicas de conscientização sobre o tema são importantes. Enfim, todas essas medidas podem reduzir o índice de alienações parentais, por exemplo”, conclui.

COMPARAÇÃO/ Para ilustrar a alienação parental, a advogada Melrian lembra do mito de Medeia, no qual a mãe mata seus filhos, ou seja, o alienador os sufoca e aniquila neles a capacidade de perceber, sentir e julgar livremente. A criança torna-se uma extensão do alienador, impedida de pensar, discriminar e escolher por si mesma.

Compartilhe:

Compartilhar no whatsapp
Compartilhar no facebook
Compartilhar no twitter
Compartilhar no pinterest
Compartilhar no linkedin

Deixe seu comentário

Noticias Relacionadas